quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

VASCULHAR O PASSADO - Uma página de Augusto Mesquita

                                                              Ermida de S. Luís

                            Segundo Túlio Espanca, a ermida está integrada no grupo de herdades da Gamela, mas situada na Quinta da Mougueira, já existente no século XVII, foi fundada em ano impreciso da mesma centúria por um dos morgados daquele título, da família dos nobres Lobos da Silva. Em 1708 e 1763, eram seus detentores, respectivamente, Manuel Lobo da Silva e Luís Diogo Lobo da Silva, fidalgos da casa real, residentes em Lisboa.
            Alcança-se por caminho particular através daquela propriedade, na distância aproximadamente de 12 Km da sede do Concelho, depois de percorrer alguns quilómetros da E.N. n.º 2, na direcção de Santiago do Escoural. Para chegar a S. Luís volte no caminho que nos leva até às Caeiras em plena Serra do Monfurado. Passa-se pela Quinta da Torre do Carvalhal, solar quinhentista com torre manuelina e ermida gótico-mudelar do Séc. XVI e pelas antigas caeiras (fornos onde era cozida a cal).
            Foi completamente reconstruída em 1794, a expensas de uma comissão de festeiros dirigida pelo juiz Pedro Vicente Pereira e pelo prior da Matriz da Vila, padre Elias, tendo como assistente da obra mestre Francisco, pedreiro de Montemor-o-Novo.
            Está situada em ponto dominante da linha SO, apoiada em adro artificial, de alvenaria, que se atinge por escalinata central, beneficiada ou construída de raiz no ano de 1877, conforme se lê numa cartela aposta na parede. Este adro, hoje meio desmoronado, na banda ocidental conserva recinto fechado com gradeamento de ferro, datado de 1876, onde se celebraram as danças dos convidados epeciais.
            Discreto alpendre de três arcos redondos, muito singelos, compõe a frontaria: o portal, moldurado e de frontão entrecortado, do estilo rococó, mantém a memória da nova feitura do templete, na verga, dividida em duas regras interrompidas, de letra desenhada, cursiva:
NO ANO DE 1794 SENDO PR.
       OR O R.P. ILIAS E OS FESTEIROS
       CAPL.º DO GATO, PEDRO MARIZ
    VICENTE PR.º SE FES.º CAPELA
 NO ANO DE 1795. SE FES
                                                               O PORTADO MESTRE FR.º

            O campanário, apilastrado, ergue-se na ilharga ocidental, com empena de enrolamento, sino de bronze, antigo, e cruz relevada
            O corpo posterior está recortado por frontão triangular, ladeado de piunáculos piramidais nascentes de bases cúbicas, de alvenaria alva de caio.
            A silhueta exterior do edifício é característica das construções rústicas do aro suburbano do Distrito, sem grandeza e pouca originalidade mas cheia de pitoresco e graciosidade.
            O interior acusa reformações posteriores aos refundamentos de 1794, embora mantenha a linha arquitectónica desta obra integral. De uma só nave e abóbada de penetrações, moldurada e de dois tramos, é totalmente revestida de estuques policromos e os alçados com apainelados geometrizantes, florais, valorizados por medalhões ovóides, d arte neoclássica, representando “S. Luís”, Rei de França, “S. Francisco de Assis”, ” Santa Isabel de Portugal” e “S. Luís”, Bispo de Tolosa.
            Conserva dois altares laterais, junto da boca do santuário, com figuras estabulares da mesma modelação mural, dedicados a “N.ª S.ª da Saúde” e “Santo António”, conservando-se neles, respectivamente, uma escultura de roca, de “N.ª S.ª do Rosário” e “S. Francisco Xavier”, esta de boa factura seiscentista, de madeira estofada, que mede, de alt. 90 cm. . Nos alçados, muitos ex-votos populares, oferecidos aquela santa.
            Tem coro falso, posterior e púlpito no lado da Epístola, com base lobulada, de pedra e balaústres recortados, de madeira.
            A capela-mor, antecida por arco-mestre redondo, apilastrado, que acusa grave ruína, é de planta quadrada e talvez sobrevivência seiscentista, embora revestida de composições coloridas, de oitocentos, do tipo de perspectivas e ornatos. O retábulo, ainda dentro da tradição rococó, de estuques mais delicados, inscreve-se em arco pleno ricamente decorado por pilastras, festonadas, rosetões, lambrequins e apainelados coloridos e dourados. No nicho, envidraçado, venera-se o titular, “S. Luís”, em traje guerreiro, coroado e empumhando o cetro real, peça antiga, de madeira, mas renovada completamente nos fins do século XIX por folha de coloração e olhos de cristal, obra que lhe fez perder o interesse artístico.
            Subsiste, aos pés do altar, grande fragmento de tapete de Arraiolos de fins do século XVIII.
            A sacristia, de telha-vã, além do paramenteiro da época de reforma da ermida, tem lavabo esculpido e porticado, de inspiração barroca, com empena de enrolamento, ornatos caprichosos e taça saliente do tipo balaústre.
            A ermida possui numerosos ex-votos, na sua maioria animais em cera, que testemunham a romaria e culto que ainda aí se realiza em Agosto.
            Dimensões interiores: nave -  comp. 9,25 x larg. 4,45; presbitério – 4,15 x 4,15 m.
            Na baixa, em terrenos fortemente arborizados, agradável de frescura e abundante de águas, subsiste a primitiva fonte de mergulho, dos peregrinos, voltada na direcção do templete, construída de alvenaria, em planta rectangular e abobadilha redonda, lisa. Tem arco pleno apoiado em duas atarracadas colunas toscanas, de granito, empena triangular e poço cilíndrico, resguardado por tanque marmóreo. No fundo do alçado, nicho desadornado do padroeiro – “S. Luís” (?). A curiosa edificação, que teve cobertura de linhas radiadas, oferece aspecto da centúria de seiscentos.
            Em 25 de Agosto realizava-se a Festa de S. Luís, que era nesse tempo (1878) a 1.ª romaria de Montemor-o-Novo. A festa era um misto de sagrado e profano. Logo na véspera e no dia da festa ocorriam as cavalhadas que tinham grande fama, e dava-se as competentes três voltas de roda da igreja. Era raro o ano que não havia desordens, tombadelas de carros e festas quase estragadas, mas por fim, o fervor pelas festas fazia com que acabasse tudo mais ou menos bem. Era costume vir policiar esta festa uma força de 20 cavalos do Regimento de Cavalaria n.º 5, aquartelado em Évora. Invocado como Protector do Gado, outrora a sua Festa incluía sempre a bênção dos gados, dos lavradores e agricultores da região.
            Até à aprovação do Código Civil de 1936, que desfez 10 freguesias no nosso concelho, S. Luís pertencia à  extinta Freguesia de São Mateus.
            Pelo facto da ermida se encontrar bastante danificada, em 1985 o saudoso Padre Alberto Dias Barbosa mandou proceder a avultadas obras de recuperação da antiga ermida.
            Depois de um longo período de interregno, o Cónego José Morais retomou estas tradicionais festas, que ano após ano, atraem até S. Luís da Mougeira muitos católicos.

Augusto Mesquita


Crónica publicada na “Folha de Montemor” referente a Dezembro 2014. Publicada ap´s permissão do Autor

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