Quinta, 17 Julho 2014 09:24
Não raramente, processos políticos em curso cruzam-se para originar
realidades aparentemente novas. Digo aparentemente porque se olharmos um pouco
para o passado iremos encontrar fenómenos semelhantes com outros protagonistas.
Como é do conhecimento público estão na arena dois
candidatos a liderar um dos partidos da oposição, até às próximas eleições
legislativas.
Confesso que não tenho acompanhado muito o que ambos
argumentam de diferente, mas tenho acompanhado o que se diz sobre o que cada um
é ou foi, dentro e fora do partido a que pertencem.
Parece que a questão central em torno deste estranho
processo (era muito mais engraçado quando as coisas se decidiam em sótãos) é
perceber qual dos dois candidatos tem mais capacidade de diálogo à esquerda ou
se encontra melhor posicionado para estabelecer as pontes para um programa de
governação à esquerda com o apoio de outras forças políticas.
São quilómetros de análises e conjecturas sobre qual dos
candidatos a candidato convencerá o PCP a alinhar com o PS no apoio a um
governo por este liderado.
Uns dizem que será o Costa, porque parece ter uma
linguagem mais à esquerda, embora outros digam que com o dito fica mais fácil a
aliança à direita porque não tem o ónus de ter sido “oposição” ao governo
liderado por Coelho e Portas.
Outros dizem que será o Seguro, embora confirmem que este
candidato será o ideal para a constituição de um Bloco Central desde que o PSD
mude de líder.
Pelo meio deste debate surge processo de dissolução do BE,
com o afastamento de uma corrente fundadora, que entretanto irá fundar outra
coisa qualquer, sob o argumento de que tudo o que existe à esquerda do PS deve
estar disponível para alinhar numa convergência, embora não se saiba o que há
para convergir ou que caminho fazer.
Todos os que se “preocupam” com esta falta de
convergência, alinham num argumento estafado que sempre foi usado pelos
“independentes” de esquerda, afirmando que o PS só se encosta à direita porque
do outro lado do espectro político existe uma enorme resistência a esse tipo de
alianças.
Não deixa de ser engraçada esta visão que defende que o
PS, quando no governo, prossegue políticas de direita porque não tem apoio da
esquerda, como se a realidade não fosse exactamente o contrário.
Claro que quando falam do apoio da esquerda se referem ao
PCP e à sua mania de não trocar ideais por lugares no governo, nem princípios
por base eleitoral.
Privatizações, encerramentos de serviços públicos,
alinhamento com as políticas de austeridade e outras no mesmo sentido tomadas
pelos governos PS, não o foram porque, coitadinhos, não tinham alternativa.
Esqueçam lá a ideia peregrina de que é a ausência de melhor companhia que leva
o PS a preferir as políticas de direita.
O insuspeito António Barreto, em declarações ao jornal
Público do último domingo, pegou exactamente pela ponta certa quando disse:
"A grande fortuna de Mário Soares foi o anticomunismo. O que fez Mário
Soares em 1975 foi o anticomunismo. É genético no PS e esse facto é um seguro
de vida para a direita".
Esta é a realidade e bem podem forçar a nota com
elaborações teóricas sobre as intransigências alheias e a construção de um
cenário que nada tem a ver com a realidade.
E já agora também escusam de ficar descansados a respeito
de uma teoria aventada pelo mesmo Barreto, no mesmo trabalho jornalístico, em
que afirma: "Quase apetece dizer que uma solução para a esquerda era rever
a situação dos últimos 40 anos. Isso é possível se o PS tiver a maioria
absoluta. Pode chamar o PCP e impor-lhe um acordo como fez François Mitterrand,
em França, em 1981."
Isto é que é o verdadeiro desconhecimento da realidade.
A realidade é que quanto mais força tiver o PCP mais
possibilidades existirão de uma convergência com todos os sectores que se opõem
ao rumo político dos últimos 37 anos.
A realidade é que no próximo dia 25 de Julho estaremos de
novo na rua a enfrentar, a sério, a política de direita. Seja ela executada
pelo PSD ou pelo PS, com ou sem muleta.
Boas férias, seja lá isso o que for
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